COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Por Roberta Brandão (MAB), com edição de Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional)

Imagens: Roberta Brandão (MAB)

 

 

Na última segunda (18), Valdenir Farias foi condenado, no Fórum Civil da cidade de Baião (PA), a 63 anos, 10 meses e 30 dias de prisão, por ser considerado um dos autores da “Chacina de Baião”, que vitimou a integrante da coordenação do Movimento dos Atingidos Por Barragens (MAB), Dilma Ferreira. O crime aconteceu no dia 22 de março de 2019. Além de Dilma, pistoleiros contratados por um fazendeiro executaram mais cinco pessoas, entre elas, três funcionários do mandante do crime; em comum, o fato de conhecerem de perto os crimes do dono da propriedade, que incluíam a prática de trabalho escravo, narcotráfico e extração ilegal de madeira.

 

Durante o julgamento, que durou todo o dia, pessoas atingidas dos municípios paraenses de Belém, Cametá, Tucuruí, Baião, Mocajuba e Breu Branco fizeram caminhada e vigília em frente ao Fórum de Baião, cobrando justiça pelas mortes de Dilma Ferreira, seu marido Claudionor Amaro Costa da Silva, Milton Lopes, Raimundo Jesus Ferreira, Marlete da Silva Oliveira e Venilson da Silva Santos.

 

Participantes do ato pregaram cruzes com nomes das vítimas da chacina em frente ao Fórum. Foto: Roberta Brandão / MAB

 

“Para nós, esse julgamento representa um avanço na luta contra a impunidade, principalmente no Pará. Esse é um caso que representa o conflito fundiário contra defensoras e defensores de direitos humanos e ambientalistas no Estado, e os jurados concordaram conosco, que não pode mais haver impunidade. É uma mudança de postura do Judiciário brasileiro, nos casos de conflito agrário e de violência contra defensores”, afirma Jaqueline Alves, advogada e assessora jurídica popular do MAB, que atuou como assistente de acusação no julgamento.

 

O primeiro acusado, Cosme Francisco Alves, foi julgado e condenado em março do ano passado a 67 anos, quatro meses e 24 dias de prisão. Este julgamento de Valdenir é a segunda condenação, e a expectativa é de que o mandante do crime, o fazendeiro Fernando Rosa, que já se encontra preso, também seja condenado no próximo julgamento. Outro participante da execução dos crimes, Glaucimar Alves, conhecido como “Cimar” ou “Pirata”, segue foragido. Já Alan Alves e Marlon Alves morreram em 2019, em confronto com a polícia.

 

Para Cleidiane Vieira, integrante da coordenação nacional do MAB, a condenação é muito simbólica. “Essa sentença significa justiça por Dilma, mas também por todos os que tombaram na luta em defesa dos direitos humanos na Amazônia: Nicinha, Dorothy, Dema, Chico Mendes. A decisão também prova que, quando o Estado brasileiro age com firmeza na busca dos criminosos, é possível fazer justiça. A luta de Dilma não foi em vão. A chama da resistência segue acesa e os atingidos e atingidas por barragens continuam em luta”, afirmou a dirigente.

 

Francisca Silva, irmã de Dilma, esteve presente no ato. Muito emocionada, afirma que enfrentou o receio da violência para poder acompanhar o julgamento dos criminosos que mataram sua irmã. “É uma dor com medo. Eu não vou mentir: a minha família só não veio mais porque tem medo do que possa acontecer”. Desde a década de 1980, o Pará tem vários casos de violência agrária sem punição dos verdadeiros mandantes. Na visão da acusação, esse clima de impunidade que paira sobre a Amazônia foi um dos fatores que levou os acusados a cometer uma chacina.

 

Dilma passou a integrar o MAB porque foi impactada pela construção da usina hidrelétrica de Tucuruí, obra inaugurada em 1984 no Pará, durante a ditadura militar. A hidrelétrica desalojou mais de seis mil famílias. De acordo com Cleidiane, “a militante era reconhecida no Movimento como alguém brincalhona, divertida e que ajudava a todos nas comunidades de atingidos: uma verdadeira liderança”.

 

Edson Gaia, militante do MAB, foi companheiro de luta de Dilma por mais de 10 anos e falou da amiga, enquanto enxugava as lágrimas. “Falar da Dilma é falar de um começo, de uma história da qual eu também faço parte. Falar da Dilma é falar de todo o movimento social, não é falar apenas sobre uma pessoa, é sobre uma história, um legado, o qual a gente não pode deixar esquecer”, declarou Edson.

 

Dilma Ferreira teve destaque no movimento quando se encontrou com a então presidenta do Brasil, Dilma Rousseff (DF), em Brasília, no ano de 2011, durante o Encontro Nacional das Mulheres Atingidas por Barragens. Na época, ela declarou: “as Marias somos nós! Nós somos as verdadeiras marias, guerreiras, lutadoras que estão aí no desafio da luta do dia a dia”, mensagem que hoje que representa luta e luto para o MAB.

 

Dilma Ferreira Silva ao lado da então presidenta Dilma Rousseff (PT) em Audiência das atingidas por barragens no Palácio do Planalto, em Brasília em 07 de abril de 2011 (Foto: Leandro Silva/MAB)

 

Entenda o caso

Segundo investigação do caso, as execuções da Chacina de Baião tiveram como motivação a queima de arquivos relacionados a crimes como trabalho escravo, narcotráfico e extração ilegal de madeira. O mandante, Fernando Rosa Filho queria esconder seu histórico criminoso matando os três trabalhadores rurais e depois Dilma, o companheiro e o cliente, que estavam presentes no bar da militante do MAB na hora da chacina.



Os trabalhadores rurais Venilson da Silva Santos, Raimundo Jesus Ferreira e Marlene da Silva Oliveira ameaçaram denunciar Fernando por conta das condições insalubres de trabalho às quais eram submetidos. De acordo com relatos, a prática de trabalho escravo nessa fazenda era comum. Não houve flagrante, porque quando as investigações aconteceram já não havia mais trabalhadores no local. Além disso, as vítimas sabiam da existência de uma pista de pouso clandestina na propriedade com a finalidade de receptação de drogas.

 

A chacina aconteceu em duas empreitadas. A primeira se deu na fazenda do mandante durante a noite do dia 21 de março. Primeiro, assassinaram a tiros Venilson e Raimundo, e, por último, Marlene da Silva Oliveira. Após o assassinato, queimaram a casa com os corpos dentro. Depois, partiram em direção ao assentamento Salvador Allende, na zona rural de Baião (PA). De acordo com a investigação realizada pela Polícia Civil do Pará, no dia seguinte da primeira matança, os acusados foram para a residência de Dilma, onde as outras três vítimas foram esfaqueadas. Segundo o inquérito policial. Dilma foi amarrada e degolada.

 

“A coordenação nacional do MAB agradece aos parceiros e apoiadores que foram essenciais para o resultado do julgamento, especialmente: a Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), Terra de Direitos, ao escritório Marco Apolo Advocacia, ao Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, ao Fundo Casa Socioambiental e ao Fundo Brasil de Direitos Humanos”, destaca Cleidiane.

 

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