COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta quinta-feira (8), após dois meses de interrupção, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) nº 3239/2004, impetrada pelo Partido Democratas (DEM), questionando o Decreto nº 4887/2003, que regulamenta a titulação de terras quilombolas no Brasil.

 

(Fonte: Fernanda Couzemenco-Século Diário / Foto: Ag. Brasil).

O próximo ministro a votar é Edson Fachin e a expectativa dos coletivos de apoio ao movimento de regularização dos territórios quilombolas no país é de que a constitucionalidade do Decreto receba seu terceiro voto favorável.

O otimismo se deve ao posicionamento de Fachin em dezembro de 2017, quando, em outro julgamento pelo STF, sobre terras pleiteadas no Amazonas, ele mencionou o Decreto 4887 para dizer que territórios pleiteados por quilombolas não podem ser destinados a quaisquer outros solicitantes, mesmo que também sejam movimentos sociais.

“Ele deu uma conotação constitucional ao Decreto”, pondera Arilson Ventura, liderança da Comunidade de Monte Alegre, em Cachoeiro de Itapemirim, sul do Estado, coordenador-executivo das Comunidades Quilombolas do Espírito Santo Zacimba Gaba e coordenador estadual da Confederação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).

A última votação da Adin aconteceu no dia 10 de dezembro de 2017, após três adiamentos seguidos, quando o ministro Dias Tofoli votou a favor da constitucionalidade, apesar de três graves ressalvas. A primeira, foi a redução do tamanho do território, que, segundo ele, estaria limitado aos espaços destinados às casas e seus quintais, sem considerar os espaços sociais, igualmente vitais para a cultura quilombolas.

A segunda foi o reconhecimento do Marco Temporal, ou seja, para Tofoli, somente teriam validades os territórios reivindicados antes da promulgação da Constituição Federal, no dia cinco de outubro de 1988.

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A terceira ressalva foi a inversão do ônus da prova, que pode trazer grandes dificuldades para o movimento. “Para nós é muito difícil provar. Sabemos que o nosso povo ficou invisível muito tempo e essa invisibilidade fez com que as pessoas não conseguissem entrar na Justiça e exigir seus direitos. Nós fomos desapropriados, teve expulsão, mesmo, muita violência no campo, que não foi relatado até hoje. Por isso é muito perigoso esse voto, que inverte o ônus da prova”, alertou, na ocasião do julgamento de dezembro, Oriel Rodrigues de Moraes, advogado da Conaq.

Sem ressalvas

Rosa Weber e o ex-ministro Cezar Peluso também já votaram a favor e contra a constitucionalidade do Decreto, respectivamente. Se as expectativas do Movimento Quilombola se confirmar, 2018 começará com três votos favoráveis à manutenção do Decreto que regulamenta os territórios tradicionais dos descendentes de africanos escravizados no Brasil, com apenas um contrário. Restarão ainda mais sete votos.

Quilombolas de diversos lugares do Brasil estão se reunindo em Brasília para fortalecer a mobilização em favor do Decreto 4887/2004. A Conaq já acertou com o STF a reserva de algumas vagas dentro do Plenário e acompanhar de perto a votação. “Acreditamos, sem nenhuma ressalva, que o decreto é constitucional”, reafirma Arilson.

Pela internet, uma petição no site do Instituto Socioambiental (ISA) coleta assinaturas em favor do Decreto, sob o lema “Somos todos quilombolas! Somos todos cidadãos! Nenhum direito a menos, nenhum passo atrás!”

No texto sobre a petição, o ISA destaca que “todos os títulos de quilombos no país podem ser anulados”, caso seja decretar a inconstitucionalidade do Decreto 4887/2004. “O futuro das comunidades está em perigo. Novas titulações não serão possíveis sem o decreto. Mais de seis mil comunidades ainda aguardam o reconhecimento de seu direito. As comunidades quilombolas são parte da nossa história, do nosso presente e também do nosso futuro”, defende.

No Espírito Santo, das mais de trinta comunidades que pleiteiam a regularização de seus territórios tradicionais, apenas uma conseguiu a titulação, em Ibiraçu, no norte do Estado. Monte Alegre está com o chamado Kit-decreto pronto, aguardando assinatura pela Casa Civil. As demais, localizadas no Território Quilombola Tradicional do Sapê do Norte, entre São Mateus e Conceição da Barra, cercados pelo deserto verde de eucaliptais da Aracruz Celulose (Fibria) e Suzano, ainda não conseguiram vencer o poder econômico das papeleiras, que criminaliza a luta quilombola e ainda usa de meios escusos para expulsar os que ainda resistem em suas terras.

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