COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Reunião da Sociedade Brasileira para o Progesso da Ciência (SBPC) discute impactos da construçãod de barragens sobre as populações tradicionais.

Os professores Carlos Vainer, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Alfredo Wagner, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), participaram da mesa “Água, energia e populações tradicionais: barragens”, ontem à tarde, 14 de julho, dentro da programação da 63ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que acontece em Goiânia (GO) desde o dia 10.

O professor Carlos focou sua explanação na apresentação do relatório final produzido por uma Comissão Especial convocada pelo Conselho da Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, sobre a situação em que se encontram os impactados pela construção de barragens no Brasil. O relatório identificou, inclusive, os direitos dos atingidos que não foram respeitados no processo de negociação das desapropriações. Seria necessário, segundo o professor, reparar e reconstruir fielmente toda a vida e o cenário social dessas pessoas que foram retiradas de suas habitações. Necessitando, com isso, a inclusão nesse processo de todos aqueles e aquelas que participavam do núcleo socioeconômico dessas famílias, afinal um indivíduo não vive isolado na sociedade, e em torno dele há fluxos de relações interpessoais, além de fluxos econômicos, que compõem a sua dinâmica social. As ações do governo e das empresas responsáveis pelas obras de grandes barragens, acabam sendo estritamente racionais e não levam em conta todos esses elementos. Há uma impressão superficial de que estão fazendo tudo ao seu alcance para “recompensar” essas pessoas pelo seu deslocamento, mas tal mudança não se reduz ao simples pagamento de indenizações ou à construção de novas casas para alojarem essas pessoas.

O contexto da vivência, das experiências, da memória e do próprio contexto social dessas pessoas acaba não sendo levado em conta, pela visão prática empreendida pelos interesses do capital. Como disse o professor Carlos, “há um estado de exceção com aparência de democracia”. Pode parecer para alguns, inclusive para o governo, que tudo está se resolvendo dentro dos parâmetros do respeito aos direitos das pessoas impactadas, mas, na verdade, há uma decisão sendo implementada à força em prol do “desenvolvimento”, e em detrimento dos direitos e da vida de milhares de pessoas.

“O ouro azul”

O professor Alfredo Wagner discutiu a mercantilização da água e sua cada vez mais provável escassez, proveniente da ação desenfreada do capitalismo. Os grandes guardiões das águas e da biodiversidade presente na natureza brasileira, as comunidades tradicionais, estão sendo expulsas e retiradas de seus territórios, pelos interesses do capital. A construção de barragens, a mineração e outras atividades estão sendo desenvolvidas e aplicadas em detrimento dos direitos dessas comunidades e da preservação do meio ambiente brasileiro. Ele contou uma experiência pessoal, como morador de Manaus (AM), em plena região amazônica, e que está tendo dificuldade de encontrar água potável. Não há mais fontes de água pura que sejam de fácil acesso para a população. É preciso cada vez mais comprar água tratada e industrializada, muitas vezes, provenientes de empresas estrangeiras instaladas na região. As fontes estão se esgotando na mesma velocidade em que quilombolas, indígenas, quebradeiras de coco, faxinalenses, vazanteiros, e tantos outros, estão sendo expulsos de seus territórios, perdendo a ligação cultural e ancestral com aquele local e os recursos de que necessitam para sua sobrevivência. A água, um bem precioso, passa a ser, também, um bem raro em um país tão rico em recursos naturais. O “ouro azul” passa a ser propriedade privada e não um bem de todos os povos.

Debate levanta preocupações quanto à atuação das pesquisas científicas nas transformações sociais

Dom Tomás Balduino, conselheiro permanente da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e bispo emérito da cidade de Goiás, participou do debate e colocou sua preocupação quanto à contribuição efetiva da ciência e da academia nas transformações sociais necessárias em nosso país. Por mais empenho que cientistas tenham em mostrar à sociedade e ao governo suas pesquisas e os impactos das ações do capital em nosso país, a palavra final sempre fica a cargo de políticos nem sempre tão sensíveis a essas informações. “O Estado a gente sabe que vai esbarrar na arrogância, no desconhecimento”, frisou ele.

Outros participantes dividiram a mesma preocupação e os cientistas presentes disseram que se empenham para que, pelo menos, pequenas vitórias sejam alcançadas e para que a população fique mais ciente dos acontecimentos em nosso país, que trazem consequências para todos. A união da pesquisa científica à vontade popular, ao empenho de toda a sociedade, pode trazer mais benefícios e transformações do que apenas as discussões em âmbitos políticos. As mudanças e a garantia dos direitos da população de manutenção e preservação dos recursos naturais de que dispõe, é consequência da ação conjunta de todos e todas.

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